O Presidente da República decidiu assinalar, ontem, 15 de março, o 50.º aniversário da Guerra, conhecida em Portugal como “do Ultramar” ou “Colonial”, conhecida nas antigas colónias do Império Português como “da Libertação”.

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Na comunicação social portuguesa, o aniversário foi amplamente assinalado por alturas do 4 de fevereiro – dia em que se assinalou a “Revolta de Luanda”, com ataques à Casa de Reclusão, ao quartel da PSP e à Emissora Nacional, acção considerada como o início da luta armada em Angola.

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Se entendermos a Guerra Colonial como a resposta a um ataque “terrorista” de movimentos de libertação, então, faz sentido assinalarmos o inicio da Guerra no dia em que esse ataque se deu. Se considerarmos que uma guerra começa no dia em que é dada uma resposta armada, em que começa o conflito – a luta bilateral, portanto – então o dia que devemos assinalar é o 15 de março.

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Foi precisamente a 15 de março de 1961 que se deu, no Cais da Rocha do Conde de Óbidos, o embarque de quatro companhias de Caçadores para reforço da guarnição de Angola.
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No mesmo dia, curiosamente, tinha início a rebelião dirigida pela UPA (União dos Povos de Angola, organização liderada por Holden Roberto, fundada em 1954, em Leopoldville, radicada, inicialmente no nacionalismo bacongo). Esta rebelião de 15 de março teve lugar no Norte de Angola, e deu-se contra os colonos portugueses e algumas populações negras, causando centenas de vítimas a quem os rebeldes cortaram as cabeças. Com o ataque da UPA, começava a vertente da guerra não virada contra os “interesses do poder colonizador” – como acontecera com os ataques de 4 de fevereiro -, mas contra os brancos e as populações negras que com eles colaboravam.

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Atente-se que não eu disse que o ataque da UPA foi contra os “colonos”. Eu disse que foi contra os “brancos e as populações negras” que não lhes eram hostis. Porque muitos desses brancos que foram decapitados no 15 de março eram muito mais angolanos do que os rebeldes da UPA – muitos deles da tribo bacongo, é certo, mas congoleses. Holden Roberto, por exemplo, nem sequer português sabia falar!

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A Guerra começava, então, a 15 de março de 1961, em Angola. Como um barril de pólvora que explode depois de muitas fontes de ignição o rodearem. Fontes de ignição como os movimentos de libertação africanos, como a falta de investimento da parte do Governo português em muitas regiões ultramarinas, como a pressão das potências da Guerra Fria no continente africano, como o distanciamento dos poderes públicos metropolitanos face às realidades coloniais, entre muitos outros fatores.

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Uma guerra que começou em 4 de fevereiro, ou 15 de março de 1961 e se prolongou por 14 penosos anos, mobilizando toda uma geração de homens portugueses, e transformando outras tantas mulheres e mães. Uma guerra que termina com o 25 de abril de 1974 – que ajuda a acontecer (por boas ou más razões) -, apesar de só em 1975 acabar de facto, e que deixa uma marca fundamental na história de Portugal.
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Guerra Colonial
1961-1974
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14 anos
Mais de 800000 mobilizados
100000 doentes e feridos
8831 mortos
[3250 mortos em Angola, 2962 em Moçambique e 2700 na Guiné; 8290 soldados pertencentes ao Exército, 346 à Força Aérea e 195 à Marinha; 4027 pereceram em combate, 1480 em acidentes de viação, 785 em acidentes com armas de fogo e 1998 devido a outras causas.]
140000 soldados com disturbios psicológicos
663.401.203 € gastos com as operações
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Fonte:
Guerra Colonial, de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes
Angola 61, de Dalila Cabrita Mateus e Alvaro Mateus
Cronologia da Guerra Colonial, de José Brandão
Associação dos Deficientes das Forças Armadas
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«Combatentes
Importa reconhecer que os soldados portugueses foram, em África, soldados de excepção. Fizeram da distância e da saudade um desafio a vencer, assumiram a falta de recursos como razão para a iniciativa e para a adaptabilidade, tomaram a juventude e os seus receios, temperados pela camaradagem e pelo patriotismo, como ingredientes para uma conduta digna e, muitas vezes, heróica. (…)
Foi a capacidade de sofrimento e o exemplo de coragem das mulheres de Portugal, a quem tantos sacrifícios foram pedidos, pela ausência ou perda dos seus, e que tudo suportaram na sua solidão e nos seus silêncios, tantas vezes esquecidas.
Foi o enorme desafio vencido por aqueles que, regressados de África, tiveram que refazer as suas vidas, começando tudo de novo, fazendo apelo ao espírito empreendedor e à capacidade de lutar que sempre os caracterizaram. Foi toda uma rede de apoios e de afectos criada no seio das famílias e do País, que facilitaram a sua integração no tecido laboral e social, ultrapassando as muitas dificuldades criadas pelo ambiente instável que se vivia.
(…)
Às gerações mais novas, é importante transmitir o testemunho de quem enfrentou a adversidade ombro a ombro com aqueles a quem confiava a vida e por quem a daria também; o testemunho de quem conhece a relevância de valores como a solidariedade, o profissionalismo, o mérito e a honra, a família e o País.
País que será mais bem defendido se contar com a mais-valia da vossa experiência e da vossa participação activa, como exemplo e fonte de motivação para os mais jovens que, tendo crescido num ambiente de maior conforto e de paz, enfrentam o futuro num Mundo incerto, onde as crises e o conflito não deixam de ser uma constante.
Combatentes,
A vossa geração criou, também, as condições para que Portugal seja um País democrático, mais livre, mais solidário e mais aberto ao Mundo. Importa que os jovens deste tempo se empenhem em missões e causas essenciais ao futuro do País com a mesma coragem, o mesmo desprendimento e a mesma determinação com que os jovens de há 50 anos assumiram a sua participação na guerra do Ultramar.
Como Portugueses, não haverá causa maior do que dedicarmos o nosso esforço e a nossa iniciativa ao serviço da Nação e dos combates que é necessário continuar a vencer, para promover um futuro mais justo, mais seguro e mais próspero para todos. Juntos, continuaremos a afirmar Portugal.
(…)
Viva Portugal.»
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Discurso do Presidente da República, ontem, 15 de março, curiosamente no Forte do Bom Sucesso, na cerimónia de Homenagem aos Combatentes, por ocasião do 50º Aniversário do início da Guerra em África.
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