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Querida Pantera,

Escrevo-te, acima de tudo, porque há palavras que não devem ficar por dizer e o meu estado de choque não me permitiu verbalizar algumas coisas, que me parecem importantes.

Desde o momento do nosso primeiro choque frontal – e tivemos tantos ao longo de, se calhar, mais de dez anos – que se criou uma certa química entre os nossos feitios. Primeiro o ódio, depois o asco, mais tarde a tolerância e por fim o Amor. Fraternal, claro está.

Sempre apreciei pessoas que eram honestas. Honestas primeiro consigo próprias e depois honestas com os outros. E tu és uma pessoa honesta. Defendes o que acreditas com unhas e dentes – como uma pantera – e não te inibes de o fazer, mesmo quando todos te dizem que estás errada, ou que não é adequado, ou propício fazer ou dizer alguma coisa. Teimosia? Irracionalidade? Surdez? Vamos, por um momento, chamar-lhe Honestidade. E eu gostava que um dia os meus filhos e os meus amigos pudessem dizer que também eu fui Honesto, como eu e os teus filhos podemos dizer de ti.

Depois és honesta com os outros. Porque não finges que gostas. Toleras, mas não deixas de não gostar. Porque não finges que esqueces. Perdoas, mas não esqueces. Porque não finges que acreditas. Ouves, mas não te deixas convencer. És transparente. E isso é honestidade.

De uma forma honesta, também eu tenho que admitir que não se acaba a Primavera com a tua partida. De forma honesta, e não me levas a mal por isso, e porque também sabes que é verdade, até há processos que se podem tornar mais fáceis… porque vão ser menos discutidos, vão ser menos escarafunchados, e pode ser mais fácil escolher o caminho do mais fácil ou do politicamente correcto… E esses caminhos são quase sempre impossíveis de trilhar contigo.

Não é a falta que fazes que me preocupa… Volto a ser honesto? De uma maneira melhor ou pior o que tem de ser feito será feito… com mais atraso, com menos cuidado, com menos brio… mas se for imprescindível estará onde deve estar a tempo.

As razões que me levam a estar triste neste momento são meramente egoístas. Sinto que com a tua partida para além de perder uma companheira, uma aliada e uma cúmplice perco, também, uma razão para lutar… porque a vontade de fazer diferente é um exercício colectivo… até o Dom Quixote precisou do Sancho Pança e cada um deles precisou dos seus cavalo e burro, respectivamente…

E não sei se alguma vez te contei… mas gosto muito da história do Quixote e o meu personagem preferido chama-se ‘Machado’ e é um amigo de Quixote, da Mancha, que não conseguindo convencer o amigo a regressar a casa decide alinhar na sua ilusão e mascarar-se de cavaleiro andante e derrotar o Quixote, fazendo-o voltar a casa da única maneira que ele poderia voltar… derrotado. Mascarou-se de Cavaleiro de ‘La Blanca Luna’.  E pobres dos que não têm um ‘Blanca Luna’ na sua vida… Contigo fora da bolha… sinto que me falta uma Branca Lua…

Sê feliz. Sabes que continuo aqui para te contrariar.