Puxão de orelhas
A propósito do encerramento das Termas de Luso

Os comerciantes e hoteleiros do Luso, através do movimento por eles criado, afirmaram, na reunião pública da Câmara Municipal da Mealhada, em 9 de Julho, que era preciso dar um puxão de orelhas ao consórcio (aparentemente) estabelecido entre a Sociedade das Águas de Luso (SAL) e a Maló Clinic Health Group (MCHG), para a gestão e desenvolvimento das Termas de Luso, concessão que a SAL detém juntamente com a da exploração da água. Dizemos aparentemente porque há quem tenha dúvidas de que esse consórcio esteja já formal e legalmente estabelecido e que tenham sido já as duas empresas a optar pelo encerramento das Termas de Luso precisamente no único período do ano em que o balneário termal estaria aberto ao público. É nossa convicção que os comerciantes e hoteleiros do Luso têm razão e que é necessária e merecida uma censura pública e relevante ao comportamento da concessionária — pelo menos essa — no âmbito do encerramento das Termas no período do Verão.
Somos testemunhas de que, em meados de Abril, poucas semanas depois do início das obras no balneário termal, — no seguimento de uma informação interna da SAL de 14 de Abril de 2009, que dava indicações para a não marcação de consultas a termalistas no período entre 27 de Junho e o final de Agosto — comerciantes e hoteleiros e a Câmara Municipal da Mealhada manifestaram a sua preocupação relativamente a um eventual encerramento das Termas. Nessa altura, ao presidente da Câmara e aos comerciantes foi dada a garantia de que as termas não iriam encerrar completamente em momento nenhum. Já nessa altura a SAL saberia que essa promessa seria muito difícil de cumprir. Os comerciantes e hoteleiros também sabiam, mas confiaram na palavra dada pela empresa. Já nessa altura a SAL sabia que a convivência de obras e termalistas no mesmo espaço traria desconforto e problemas. Os comerciantes e hoteleiros também sabiam, mas confiaram na palavra dada pela empresa. Já nessa altura a SAL sabia que as estruturas dos edifícios a recuperar estavam muito mais degradadas do que inicialmente previa. Os comerciantes e hoteleiros também sabiam, mas confiaram na palavra dada pela empresa. O encerramento das Termas é agora apresentado como a opção lógica e inevitável. No entanto só à SAL é que, em Abril, o contrário parecia verosímil.
Não temos dados que o garantam, nem, apesar das tentativas realizadas conseguimos apurar da veracidade do que afirmamos, mas custa-nos acreditar que a MCHG esteja já totalmente envolvida em todo este processo. Provavelmente — e reflexão é especulativa — o acordo entre a SAL e a MCHG passará pela entrega do balneário recuperado e ‘como novo’ à MCHG, em Outubro de 2009, para esta empresa o explorar a partir daí. Assim, a recuperação do imóvel é uma responsabilidade exclusiva da SAL na qual a MCHG não se envolve nem investe, dado que o espaço faz parte da concessão do Estado à SAL. Esta parece-nos ser a solução empresarialmente lógica e justificaria o facto de a SAL continuar a ser a única interlocutora com a autarquia e os comerciantes e hoteleiros em todo este processo.
Esta tese — de que poderemos ter a comprovação ou não — manteria incólume a ideia que tínhamos, e que sempre aqui manifestámos, do profissionalismo, da seriedade, da ambição e do rigor da MCHG. Porque nos pareceu sempre muito estranho que a atitude de convicção com que Paulo Maló assumiu o compromisso de ter as termas a funcionar no prazo acordado acabasse por se transformar num bluff tão grande. O facto de o projecto ter demorado dois terços dos dezoito meses a fazer e que as obras se restringissem a seis meses parece mau de mais para ser gestão da MCHG. A intransigência da parte da SAL em ter as obras prontas em Outubro, custe o que custar, acaba por ser — segundo a nossa tese — não decorrente do compromisso de honra do consórcio perante o Luso e a Câmara da Mealhada — até porque estes estariam na disposição de ver o fim das obras adiado unicamente para não fechar no Verão — mas sim decorrente do compromisso da SAL com a MCHG de lhe entregar a chave para exploração das Termas naquele prazo, cujo incumprimento poderá dar lugar a indemnização.
A tese que alvitramos justifica muitas coisas verificadas até aqui, que, pelo menos para nós, são incompreensíveis.
Nesta edição damos conta de que estará reatada a “paz” entre os comerciantes e hoteleiros do Luso e a Câmara da Mealhada. É de aplaudir este facto. Terá havido excessos cometidos que, necessariamente, devem ser ultrapassados, mesmo que não sejam, para já, “perdoados”. E temos conhecimento de que a Câmara da Mealhada, no sentido de manter o alojamento dos termalistas habituais no Luso, garantirá o transporte destes para as Termas da Curia a fim de fazerem tratamentos. Este será o resultado visível do entendimento entre Câmara e lusenses.
Como dizia um vereador na reunião do executivo municipal de 9 de Julho, a publicidade negativa que os lusenses poderiam fazer à SAL em consequência do encerramento das Termas é contra-producente. Trata-se de cortar a árvore que dá sombra e que poderá sustentar o efeito de promoção turística que se pretende no futuro. A publicidade negativa não é, portanto, um meio que possa ser utilizado. Mas é verdade que alguma censura deve ser feita. A empresa começou as obras (que previsivelmente durarão seis meses) precisamente na única altura em que não o deveria ter feito, com prejuízo para os comerciantes do Luso mas também para a MCHG e para o futuro das Termas. A empresa faltou à verdade a um presidente da Câmara e a toda uma comunidade. E isso não pode deixar de merecer reprovação.

Editorial do Jornal da Mealhada de 22 de Julho de 2009