Ontem, na RTP1, ao serão, assisti a uma reportagem sobre a prostituição (apenas feminina, pareceu-me) em Portugal. Uma atividade – respeitável, assim considero – que na ótica da (corajosa) jornalista deixava três mensagens fundamentais:

1. Antigamente, com os bordéis é que era bom;

2. Os chulos de hoje são os jornais;

3. As prostitutas são pessoas respeitáveis que se prostituem por gosto ou por vício.

Não me cabe, aqui, abrir qualquer espécie de demanda a propósito deste tema. Não tenciono citar os prós e os contras do proxenetismo legal, nem do exemplo de outras legislações europeias. Não tenciono defender os donos dos jornais que, certamente, pedirão pelo anúncio até ao limite em que as pessoas estiverem dispostas a pagar. Não tenciono fazer juízos de valor sobre a atividade.

Mas este é um debate curioso, se feito com inteligência. O que nem sempre é fácil na dialética dos temas fraturantes.

As sextas-feiras n’O Fio dos Dias costumavam ser destinadas às mulheres e ao culto do feminino. E hoje senti-me impelido a fazer aquela espécie de crónica dos bons costumes, mas ao contrário. Não no sentido de garantir que agora é que vivemos no período da decadência máxima, dos alvores do fim dos tempos, na banda sonora das trompetas do apocalipse, mas ao contrário. No sentido de dar mostras de que já vivemos tempos mais decadentes, mais promíscuos, mas sanguíneos, mais violentos, mais terríveis.

Socorro-me de uma imagem – um quadro de uma tira – da banda desenhada “Bórgia”, do roteirista chileno Alejandro Jodorowsky e do ilustrador italiano, o fantástico e erótico Milo Manara.

A imagem que aqui coloco é do terceiro volume da série “Bórgia”, que saiu em 2008, intitulada “Bórgia – As chamas da fogueira”. Uma série de banda desenhada que aconselho vivamente – sou fã da arte, de Manara, e na FNAC vou saciando os olhos com os dois primeiros volumes desta série.

Este quadro não precisa de grandes narrativas e é perceptível sem grandes descrições!

A história dos Bórgia é um clássico. Os Bórgia são a família espanhola-italiana que no século XV marcaram a história da Europa de forma indelevel. No Papado – com dois papas (Calisto III, Alfonso Bórgia, e Alexandre VI, o sobrinho Rodrigo Bórgia) – e na realeza – pela mão dos filhos do papa Alexandre, nas armas de César, no leito de Lucrécia.

“Enquanto Rodrigo Bórgia viria a se tornar o Papa Alexandre VI, no final do século XV, seu filho, César, virou príncipe e teria inspirado o escritor Maquiavel. Isto sem contar Lucrécia Bórgia, filha ilegítima de Rodrigo e amante dele e de César. “Bórgia – As chamas da fogueira” (Conrad, cor, 56 pgs., R$ 43) saiu na França em 2008, dois anos depois do segundo volume que, por sua vez, também demorou dois para ser publicado. Assim, é possível que tenhamos que esperar mais dois para ler a conclusão da pecaminosa história do clã que deitou e rolou na Renascença. Safadezas à parte, a polémica história do Papa e de seus filhos é um prato cheio para Manara e suas taras gráficas. Vale a pena esperar o tempo que for por cada trabalho do italiano. As páginas desenhadas por ele valem o sacrifício. E, mesmo que o pecado esteja nos olhos de quem vê, Manara faz questão de que a gente veja, pode estar certo disso.” Em português do Brasil, na descrição do suplmento cultural do jornal Globo.