Eu teria 16 anos quando, numa reunião do Conselho Pedagógico da Escola Secundária da Mealhada, na dupla qualidade de representante dos alunos e presidente da direcção da Associação de Estudantes, tomei a palavra para apresentar aos conselheiros o plano de actividades da associação a cuja direcção presidia, para o ano lectivo 1995/1996.

Nessa ocasião, e no quadro de um conjunto de iniciativas de promoção à cidadania, informei que a associação colocaria no átrio, durante um determinado dia, uma aparelhagem que passaria música de intervenção “do saudoso tempo do PREC”. A frase que proferi, “saudoso tempo do PREC”, estava, também, escrita no próprio plano que havia sido distribuído a todos os conselheiros.

Eu tinha ouvido esta frase numa gravação de um concerto de Zeca Afonso, dita pelo próprio, sem nunca me ter preocupado, verdadeiramente, em perceber o seu verdadeiro alcance! Note-se que, apesar do que acabava de dizer, eu era, nesta altura, um anti-comunista primário, completamente reaccionário.

Assim que a frase me saiu da boca, logo um dos professores presentes na reunião – um dos professores que eu mais respeitava e ainda hoje admiro (que não identifico para não causar melindre) – faz lavrar um veemente protesto pelo que acabava de ser dito, vincando, absolutamente, que o que eu acabava de dizer era um ataque sério à sua pessoa, na medida em que fora vitima de perseguições durante o PREC e que não admitia que semelhante adjectivação fosse feita na sua presença sem o seu protesto. Eu fiquei atónito, esboçaram-se alguns sorrisos entre os presentes e logo outra professora subscreve as palavras do primeiro professor.

A contestação ao que eu acabara de dizer continuou com a ameaça de que se ausentariam da sessão se eu repetisse a mesma ideia. Retomei a minha intervenção, retirando o que acabara de dizer, pedindo desculpa pelo melindre. Fi-lo, apenas, por respeito ao professor que se manifestou ofendido.

Quando a reunião terminou, eram normalmente às quartas à tarde, saí da sala e fui abordado pelo professor a quem prometi que procuraria no dia seguinte. Saí da escola e fui para casa procurar na Enciclopédia o que era, então, o PREC. Não encontrei nada de esclarecedor, para além da descodificação da sigla: Processo Revolucionário Em Curso. Precisei de ir à Biblioteca Gulbenkian – na Rua Branquinho de Carvalho -, onde o Sr. José, pacientemente, me recomendou onde procurar. Como na altura não havia internet, tive ainda necessidade de ir ao jornal procurar alguém que me pudesse ajudar e falar com o meu avô António, sempre no sentido de perceber onde é que estava a origem do melindre.

Depois de ouvir algumas pessoas, percebi rapidamente, onde é que eu falhara. No dia seguinte, dirigi-me ao referido professor, a quem pedi desculpa, sem querer aprofundar o assunto. Na associação retirámos a expressão da versão impressa e por mim o assunto estava terminado.

Nunca deixei, no entanto, de procurar saber mais sobre esse período da História de Portugal. Um período pelo qual tenho curiosidade e o respeito a que obriga o facto de ser uma fase relativamente recente da nossa vida colectiva e por causa da qual ainda haverá algumas feridas.Para algumas pessoas, haver alguém, como eu, que nasci depois de 1975, a criticar tão severamente o PREC e a elogiar, de forma tão categórica, o fim do PREC, pode ser insultuoso. Acredito e respeito todos aqueles que acreditaram que esse processo levaria à criação de uma sociedade mais justa, mais fraterna e mais livre. Eu respeito, os que acreditaram que o PREC poderia dar origem aos “amanhãs que cantam!”. Respeito. E por isso a minha critica ao PREC, e o meu elogio ao 25 de Novembro não são insultos, são opiniões.Insulto é o facto de, nos dias de hoje, alguém tentar procurar na Internet alguma informações sobre o que foi o 25 de Novembro e não encontrar. Insulto é o facto de, nos dias da sociedade de informação, não haver um banco de imagens – nem fotográficas nem em video – dos acontecimentos de 25 de Novembro, nem do Grupo dos Nove! A esquerda intelectualoide orfã do PREC tratou de apagar esse dia ‘dos compêndios’ e da nossa história. A inteligentzia dos politburos da história oficial mostra-se diligente em tratar o 25 de Novembro como um acontecimento menor da história da democracia em Portugal.Mesmo arriscando o rótulo de reaccionário, considero que o 25 de Novembro foi o momento refundador da Democracia Portuguesa. Não se está com isto a menosprezar o 25 de Abril, está a garantir-se que o sonho de uma Democracia verdadeira se concretizou graças ao 25 de Novembro. E que se não fosse o 25 de Novembro Portugal teria sido, em 1975, a Cuba da Europa e (mais uma) Ditadura do Proletariado.Para que cada um faça a sua própria análise e leitiura, ficam aqui dois videos que o blogue 31 da Armada produziu sobre o 25 de Novembro de 1975. O blogue 31 da armada é, provavelmente, o único espaço na blogosfera portuguesa a preocupar-se e onde é possivel encontrar dados sobre esta temática.No primeiro video estão os depoimentos de Rui Ramos – historiador ideologicamente distante da inteligentzia do politburo que determina a história oficial – e de Mário Tomé – um dirigente da UDP, da esquerda radical (hoje no Bloco de Esquerda – ele e a UDP entenda-se), que na minha cabeça é, apenas, o único deputado que se recusou a votar um voto de pesar pela morte do primeiro-ministro e do ministro da defesa (Sá Carneiro e Amaro da Costa) em 7 de Dezembro de 1980 (declarou, para a acta da Assembleia da República que não lamentava as suas mortes).

Este segundo video é de Zita Seabra, dissidente do PCP, que testemunha, na primeira pessoa, o que ia na cabeça do Comité Central com as movimentações de 25 de Novembro de 1975.

O Comunismo até pode ser um bom sistema politico. Mas eu prefiro a Democracia!